sábado, 13 de junho de 2009

Sartre e seu existencialismo

                Um curto relato sobre o existencialismo não é possível sem falar, com a mesma dedicação, de Jean-Paul Sartre. O francês, talvez o mais famoso do último século, nasceu numa família burguesa em 21 de junho de 1905, em Paris. Seu pai morreu antes de Sartre nascer, e este afirma que, devido a ausência da figura paterna, cresceu livre de um superego formal burguês que teria impedido seu desenvolvimento intelectual e filosófico ("Se tivesse vivido, meu pai teria desmoronado sobre mim e me esmagado"[i]). Formou-se em filosofia, freqüentando bares e cafés acompanhado de ninguém menos que Merleau-Ponty, Lévi-Strauss, Simone Weil e Simone de Beauvoir.

                Mudou-se para Berlim, em 1933 para estudar a filosofia que cunhou de existencialismo. Tomou o termo emprestado do filosofo Kierkgaard, que sustentava o “individuo existente” a única base para uma filosofia significativa. Quando escreve “O existencialismo é um humanismo” entende a liberdade individual em relação com a responsabilidade social e ao engajamento político. Simpatizante do marxismo, Sartre alega que "o marxismo reabsorveu o homem na idéia, e o existencialismo o procura por toda parte onde ele esteja - no trabalho, em casa, na rua"[ii] Rejeita o premio Nobel de Literatura em 1964, dizendo que "o escritor não se deve deixar transformar pelas instituições"[iii]

No “Club Maintenant”, em 1945, Sartre explica um dos princípios fundamentais do seu existencialismo, “a existência precede a essência”. A sentença esta inserida na seguinte fala

"... se Deus não existe, há pelo menos um ser, no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito, e que este ser é o homem ou, como diz Heidegger, a realidade humana. Que significa então que a existência precede a essência? Significa que o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que só depois se define. O homem, tal como o concebe o existencialista, se não é definível, é porque primeiramente é nada. Só depois será, e será tal como a si próprio se fizer."

Ao negar uma essência anterior, nega também uma metafísica que possa explicar o homem e sua realidade. Rejeita todo o platonismo corrente na filosofia e aponta para a materialidade da existência, a materialidade dos fenômenos. A única certeza que pode ser afirmada de inicio é a certeza da existência. Nenhuma natureza humana entra em questão, e toda compreensão humana é baseada na realidade da experiência do sujeito – que por sua vez vai compor a essência do homem. Caracteriza subjetividade como aquilo que o homem faz de si mesmo.

Se a essência é aquilo que próprio homem constrói para si, então tal homem é responsável pelo que é, e pelo que faz. A ênfase na responsabilidade humana é a segunda peculiaridade do existencialismo. O homem é responsável pela própria existência e pelas conseqüências que sua existência, seus atos, produz no mundo e nos outros. A relação entre o existencialismo sartriano e a política é evidente e inevitável.

                “O homem está condenado a ser livre”. O existencialismo de Sartre aborda a liberdade como uma pena que incide sobre todo sujeito. Cada um é livre para escolher seu projeto de vida, e cada projeto implica em ações que refletem na humanidade. Dessa forma todo homem é responsável pelo caminhar da humanidade. Se a humanidade está em declínio moral ou social, todo individuo é responsável pela condição. Ao escolher não se engajar para modificar o quadro e depositar esperanças em figuras de autoridade, o sujeito está exercendo sua liberdade de escolha, mas tentando fugir da culpa através da má-fé, quando justifica a situação depositando a responsabilidade em outra pessoa.

A má-fé consiste numa defesa, numa explicação, que o sujeito atribui a si próprio para explicar a “razão” de seus atos, de sua vida. Toda explicação que tente justificar a situação negando a responsabilidade pela própria escolha é uma atitude de má-fé. É uma incapacidade para arcar com as próprias responsabilidades. Para Sartre, é necessário que o homem abandone esse habito que o afasta, falsamente, das conseqüências de suas escolhas, e passe a assumir as responsabilidades que suas escolhas acarretam. Ao abandonar a má-fé o homem deixa de se enganar, e passa a conviver com a angústia que sua liberdade produz, devido às conseqüências de seus atos. A liberdade individual implica na angustia existencial. Por isso Sartre caracteriza a liberdade como uma condenação ao homem. Não existe culpa quando não somos responsáveis pelos nossos atos. Mas também não existe liberdade.

Segundo o comentário de Artur Polônio, “se a vida não tem, à partida, um sentido determinado [...], não podemos evitar criar o sentido de nossa própria vida”. Assim, “a vida nos obriga a escolher entre vários possíveis [mas] nada nos obriga a escolher uma coisa ou outra”.

“O inferno são os outros”. Se o homem é responsável por aquilo que escolhe ser, e se cada um carrega um projeto de vida passível de ser concretizado, uma vez que é livre, então a única coisa que pode frustrar o desejo do sujeito são os projetos de vida dos outros. Todos são livres para se afirmar, ao mesmo tempo, todos são um obstáculo à afirmação do outro, e também o único meio de afirmação de tal projeto. O paradoxo existencial contribui para a angústia antes mencionada. A humanidade só sairá do buraco que cavou para si mesma quando todos reconhecerem sua influencia e arcarem com seus atos. Cada homem é responsável pela humanidade, ainda que muitos não acreditem. Solucionar o conflito entre as escolhas dos homens é o maior desafio para o sujeito existencial, ou seja, para aquele que é consciente da sua liberdade e suas conseqüências.

                Seguindo a fenomenologia, o existencialismo diferencia seres Em-si de seres Para-si. O ser Em-si é todo aquele objeto, ou coisa, dotado de uma função, uma essência, pré-determinada. São os objetos que construímos, os fenômenos naturais, tudo aquilo que podemos atribuir uma função e que não são dotados de autoconsciência. A consciência, ou o homem consciente, é um ser Para-si, pois é consciente de sua própria consciência, e, portanto, regente de sua própria existência. Entender o homem como um ser Para-si é entender o homem como uma figura única no mundo, capaz de construir e destruir através de seus atos. Toda ciência e filosofia que encare o homem como um ser Em-si retira do homem aquilo que o destaca dos outros seres: sua liberdade de construir e alterar sua essência.

Obras filosóficas: A Imaginação (1936) - A transcendência do Ego (1937) - O Imaginário (1940) - O Ser e o Nada (1943) - O existencialismo é um humanismo (1946) - Crítica da Razão Dialética (1960) - O idiota da família (1971) - Anotações para uma moral (1983)

Ensaios: São Genet, comediante e mártir (1952) - Questão de método (1960)

Romances e Contos: A náusea (1938) - O muro (1939) - A idade da razão (1945) – Sursis (1945) - Com a morte na alma (1949)

Teatro: As moscas (1943) - Entre quatro paredes (1945) - Mortos sem sepultura (1946) - A prostituta respeitosa (1946) - As mãos sujas(1948) - O diabo e o bom Deus (1951) - Os seqüestrados de Altona (1960)

Autobiográficas: As palavras (1964) - Diário de uma guerra estranha (1983)

Fontes:

 http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean-Paul_Sartre

http://pt.wikipedia.org/wiki/Existencialismo

http://www.cobra.pages.nom.br/ftm-existencial.html

http://www.geocities.com/Athens/olympus/7979/visao.htm

http://www.infoescola.com/filosofia/existencialismo/

http://existencialismo.sites.uol.com.br/sartre.htm

[i] STRATHERN, Paul. Sartre em 90 minutos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999. p. 9.

[ii] STRATHERN, Paul. Ibid., p. 64.

[iii] STRATHERN, Paul. Ibid., p.68

3 comentários:

Leila disse...

Adaptando: "Se tivesse vivido meu pai teria me castrado"

Anyway Sartre realmente quer pessoas engajadas, mas pensando por pessoas que agem de má fé, elas realmente tem uma consequencia disso, ou pior mesmo são aqueles que querem ser consientes de todas suas decisões?

pois de certa maneira quem sofre mais são aqueles engajados, além de ter atividades extras cada vez que algo não dá certo eles sofrem, em vez daqueles que agem de má fé e deixam os outros decidirem, assim se não der certo a culpa nunca sera destes....

sei lá...

Evelyn disse...

Olha só, abro seu blog e me deparo com Sartre e camus, dois dos meus preferidos....


muito bom seu blog!!!

beijos

Anônimo disse...

Boa tarde. Me chamo Alexandro, estou pesquisando sobre a relação entre Existencialismo e a Gestão de Pessoas (RH), com ênfase na Responsabilização. Gostaria de sua ajuda no sentido de indicar algum material. Desde já agradeço! Abraço. alexxbarros@hotmail.com